Publicado em 18/08/2016
Temer transfere ao PMDB uso de verbas contra a seca
MP libera crédito extraordinário de R$ 790 milhões para obras emergenciais na Região Nordeste; gestão de recursos, antes de governadores, passa a ser do Dnocs
Na mesma semana em que começou a campanha eleitoral nos municípios brasileiros, o presidente em exercício Michel Temer (PMDB) retirou dos governadores do Nordeste a execução de obras destinadas ao combate à seca para transferi-la ao Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), órgão controlado predominantemente por peemedebistas.
O Palácio do Planalto também decidiu aumentar o valor repassado a Estados governados pelo PMDB, como Sergipe e Alagoas. A decisão ocorreu após uma reunião no Palácio do Jaburu, no domingo, 14, entre Temer e o ministro da Integração Nacional, Helder Barbalho, presidente em exercício do PMDB do Pará e filho do senador Jader Barbalho (PMDB-PA).
A decisão reverte um acordo feito pela presidente afastada Dilma Rousseff de que caberia aos governadores a gestão desses recursos. A gerência das verbas para obras contra seca costuma ser disputada por nomes de todos os partidos pelo fato de servir como arma eleitoral por políticos da região.
A liberação dos recursos foi autorizada por Temer com a edição da uma medida provisória no fim de julho que abriu crédito extraordinário de R$ 789,9 milhões para ações emergenciais no Nordeste, que enfrenta o quinto ano consecutivo de seca, segundo a Agência Nacional de Águas (ANA). Parte do valor será destinada para obras emergenciais, como a construção de adutoras e perfuração e instalação de poços.
Segundo o Ministério da Integração Nacional, a decisão de
transferir a gestão dos recursos se deu porque, na avaliação do governo, o
Dnocs é o órgão que tem “anos de experiência em obras contra a seca”. “A
expertise do Dnocs está acima de qualquer questionamento. É o órgão que tem
mais know-how e especialização em obras emergenciais de seca”, disse o
ministro, por meio de sua assessoria.
Dos nove Estados do Nordeste, só o Maranhão não faz parte do
plano, pois não enfrenta seca como os outros. Na região, segundo pesquisas,
Temer tem o maior índice de rejeição.
Indicações. A decisão de Temer favorece o PMDB na medida em que o Dnocs é
controlado na maior parte dos Estados pelo partido. No Ceará, por exemplo, o
líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira, é o responsável pela indicação tanto
do coordenador regional quanto do diretor-geral nacional do órgão. O senador é
adversário político do governador cearense, Camilo Santana (PT).
No Rio Grande do Norte, a indicação do coordenador do órgão partiu
do senador Garibaldi Alves (PMDB) e do ex-ministro Henrique Eduardo Alves
(PMDB). Ambos são adversários do governador Robinson Faria (PSD). Na Paraíba, o
favorecido será o senador José Maranhão (PMDB-PB), padrinho do coordenador
regional do Dnocs. Ele é adversário do governador Ricardo Coutinho (PSB), que
se posicionou contra o impeachment de Dilma.
Em Estados administrados pelo PMDB, as obras também serão tocadas
pelo Dnocs, mas a Integração Nacional ampliou os recursos que serão enviados,
por ordem de Temer.
Para Alagoas, governado por Renan Filho (PMDB), o presidente em
exercício mandou aumentar o repasse de R$ 2 milhões para R$ 10 milhões, segundo
a pasta. O governador é filho do presidente do Senado, Renan Calheiros
(PMDB-AL), que vem se aproximando de Temer nas últimas semanas. O mesmo
aconteceu em Sergipe, administrado por Jackson Barreto (PMDB), onde saltará de
R$ 3 milhões para R$ 10 milhões.
Nos Estados controlados pela oposição, a decisão favoreceu aliados
de Temer, como no Piauí, administrado pelo petista Wellington Dias, onde o
Dnocs é comandado por aliados do senador Ciro Nogueira (PP).
‘Politização’. Governadores
criticaram a decisão de Temer. “Não quero acreditar que isso foi feito por
questões políticas”, disse o governador do Ceará. Robinson Faria disse ter
recebido “com surpresa” a decisão.
Já o candidato a vice-prefeito de João Pessoa (PMDB-PB), deputado
Manoel Júnior, avalia que os governos estaduais “politizam” a execução dos
recursos. “Quando o governo manda dinheiro, eles só gastam nos municípios que
eles têm interesse.” Eunício reconhece o sucateamento do Dnocs, mas diz que a
mudança vai contribuir para revalorizá-lo.
Demissão. A decisão do ministro
da Integração Nacional, Helder Barbalho, de transferir a gestão dos recursos de
combate à seca na Região Nordeste dos governadores para o Dnocs foi um dos
motivos que levaram ao pedido de demissão do secretário nacional de Proteção e
Defesa Civil, o general do Exército Adriano Pereira Júnior. A secretaria é
ligada ao Ministério da Integração Nacional.
Pereira Júnior estava no cargo desde outubro de 2013, no primeiro
mandato de Dilma Rousseff. O general foi o responsável por firmar um acordo no
qual os governadores ficavam encarregados de gerir os recursos para o combate à
seca. “Foi apenas um dos problemas, mas não foi determinante para minha saída”,
disse ao Estado o general, que se posicionou contra a medida.
Pereira Júnior afirmou que tinha colocado o cargo à disposição desde que Temer assumiu a Presidência interinamente e que Helder Barbalho já tinha indicado que o demitiria. “Só resolvi antecipar”, disse.