Publicado em 19/07/2018

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Jovens com alto uso de mídias digitais têm mais risco de ter déficit de atenção e hiperatividade, diz estudo

Pesquisa seguiu 2587 estudantes sem o transtorno por um período de dois anos. Aqueles com uso frequente de mídias digitais apresentaram sintomas da doença ao longo do tempo.


Jovens com alto uso de mídias digitais têm mais risco de ter déficit de atenção e hiperatividade


Mensagens, posts, tuítes, streamming de vídeo, séries, games .... a diversidade de conteúdos digitais é tamanha que não é raro passar o dia entre o trio celular-computador-tablet. Há consequências, contudo. O mais novo estudo a demonstrar isso foi publicado essa terça-feira (17) no "JAMA": aqueles com mais alto uso de mídias digitais têm mais chance de desenvolver TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade).


As evidências não são novas, mas a pesquisa tem novidades principalmente porque seguiu 2587 adolescentes por dois anos e analisou a influências das mídicas contemporâneas: a maior parte dos estudos anteriores considerava o uso de mídias antes da avalanche de exposição atual.


"O estudo demonstra empiricamente o que a gente já desconfiava há muito tempo. A gente vem alertando há dez anos que um pedágio seria cobrado por esse uso", diz Cristiano Nabuco, psicólogo e coordenador do grupo de dependência tecnológica do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP.


Nabuco destaca que as novas tecnologias reproduzem operações mentais similares a de uma pessoa que tem déficit de atenção. "É por isso que pessoas com TDAH têm mais facilidade com a tecnologia", explica. Na esteira, aqueles que não têm a condição começam a ser expostos às mesmas operações mentais de quem tem a doença -- fator que aumenta o risco.


Na prática, no entanto, não se pode dizer nesse momento que as mídias digitais causem o TDAH, avalia Nabuco. Há evidências de que pode fazer com que uma pessoa com predisposição genética de fato desenvolva a doença. Outro ponto, contudo, é que a tecnologia pode dificultar o controle de impulsos, aspecto que faz parte de um dos sintomas do transtorno.


"O uso das telas, como a gente costuma falar, entraram pela porta dos fundos do cotidiano, de forma recreativa e sem a atenção necessária", diz Cristiano Nabuco. "Tem de haver um controle sobre o uso, no sentido de que o adolescente deve realizar suas atividades normalmente. A tecnologia deve ficar restrita ao tempo que sobrar", aconselha.


Autores da pesquisa destacam que as mídias modernas não são comparáveis às tradicionais. "Há diferenças de velocidade, de nível de estimulação e potencial de estimular alta exposição", escreveram.


"Novas tecnologias móveis podem fornecer estimulação rápida e de alta intensidade, acessível o dia todo, o que aumentou a exposição à mídia digital muito além do que foi estudado antes", disse Adam Leventhal, professor da Universidade do Sul da Califórnia, em nota.


Segundo Nabuco, pesquisas mostram que, em 8 minutos de jogo em rede, por exemplo, há uma forte liberação de dopamina, neurotransmissor associada à recompensa e ao prazer.


"Na China, a tecnologia é chamada de heroína eletrônica", diz Nabuco. "É um problema de saúde pública".


A análise atual foi feita com 2587 estudantes entre 15 e 16 anos que não apresentavam sintomas ou diagnóstico de TDAH. Eles foram seguidos por dois anos. Adolescentes foram questionados sobre o uso de 14 plataformas digitais comuns.


Depois das perguntas, cientistas classificaram os jovens de acordo com a frequência de uso de mídia em três categorias: sem uso, uso médio e alto uso.


Os resultados da pesquisa foram os seguintes:

1. 9,5% das crianças que apresentaram alto uso em metade das plataformas pesquisadas desenvolveram sintomas de TDAH;

2. 10,5% das crianças que apresentaram alto uso em todas as plataformas desenvolveram sintomas de TDAH;

3. 4,6% das crianças que não relataram uso frequente de nenhuma mídia digital desenvolveram sintomas de TDAH.


Levanthal, um dos autores do estudo e pesquisador da Universidade do Sul da Califórnia, diz que a associação é significativa, embora mais pesquisas precisam demonstrar se se trata de uma relação causal (ou seja, que a tecnologia de fato leve ao transtorno).


"Nós podemos afirmar com confiança que jovens altamente expostos a mídias digitais têm mais chance de desenvolver TDAH no futuro", diz Levanthal, em nota.


Além do TDAH, pesquisas anteriores demonstraram que, quanto mais cedo o uso, maior a possibilidade de problemas de desenvolvimento da linguagem em crianças. O cérebro precisa das interações sociais pouco previsíveis das relações humanas. "A criança lida com a repetição com as mídias digitais" diz Nabuco.


G1.globo.com

Monique Oliveira